ACTO DA PRIMAVERA
CICLO DE CONVERSAS E VISITAS
Cinema
Horário: 17:00
ACTO DA PRIMAVERA
PT |1963 | 94 min.
Manoel de Oliveira
Sessão organizada em colaboração com o Cineclube do Porto e em diálogo com a apresentação da versão restaurada de O Auto da Floripes (1959-1963).
ACTO DA PRIMAVERA, de Manoel de
Oliveira, regista de uma representação popular do Auto da Paixão de Cristo
pelos habitantes da Curalha, aldeia do concelho de Chaves. O projeto surgiu
durante a preparação de O PÃO (em 1957-58), quando o realizador percorria a
paisagem transmontana em busca de moinhos de vento que servissem de cenário
para esse documentário. Deparando-se com três cruzes de madeira erguidas junto
à estrada, o realizador inquiriu sobre o seu propósito, tomando então
conhecimento da festa popular que lhes estava associada. Em 1959 pede apoio ao
Fundo Nacional do Cinema para a rodagem do filme REPRESENTAÇÃO POPULAR DO AUTO
DA PAIXÃO DE CRISTO, conseguindo o financiamento do dito instituto (depois de mais
de uma década de sucessivas recusas). Filmado entre 1960 e 1961 (numa rodagem
particularmente difícil, uma vez que os atores, além de não serem
profissionais, não podiam descurar as suas tarefas agrícolas), o filme passa
por um longo processo de pós-produção, acabando por só estrear em outubro de
1963.
É também em 1959 que a secção de
Cinema Experimental do Clube Português de Cinematografia – Cineclube do Porto
inicia a rodagem de O AUTO DA FLORIPES, realização coletiva de António Lopes
Fernandes (um dos elementos da comissão fundadora da dita secção), Adelino
Felgueiras, Alcino Soutinho, António Reis e Arnaldo Araújo, a partir de uma
ideia de Henrique Alves Costa. À semelhança de ACTO DA PRIMAVERA, o filme
regista uma representação popular cuja origem remonta ao século XVI-XVII,
integrada na romaria da Senhora das Neves, aldeia do distrito de Viana do
Castelo. Enfrentando dificuldades técnicas semelhantes às experienciadas por
Oliveira, nomeadamente ao nível do som, O AUTO DA FLORIPEDES apenas teria a sua
primeira apresentação pública em janeiro de 1963.
Se as afinidades entre os dois
filmes são evidentes, tanto no que respeita à coincidência temporal como à
abordagem etnográfica, elas participam também de um movimento que, em finais
dos anos 1950 e a partir de diferentes enquadramentos disciplinares, se empenha
na redescoberta da cultura popular em moldes muito diferentes do folclorismo
populista promovido pelo Estado Novo. Basta, por exemplo, pensar no “Inquérito
à Arquitectura Popular em Portugal”, em que participaram José Huertas Lobo,
Francisco Keil do Amaral e Fernando Távora, entre outros, na “Antologia da
Música Regional Portuguesa”, produzida a partir das recolhas de Michel
Giacometti e Fernando Lopes-Graça, ou no modo como Ernesto de Sousa traz o
trabalho de alguns barristas de Barcelos para o domínio da arte contemporânea.
Note-se, a este propósito, que ACTO DA PRIMAVERA era parte de um projeto mais
ambicioso a que Manoel de Oliveira chamou “O Palco dum Povo” e com o qual
pretendia fazer um retrato cinematográfico de diversas atividades culturais por
todo o território nacional. Dois dos filmes que deveriam integrar este projeto
partiam, aliás, também eles, de atos populares – o “Auto da Criação do Mundo” e
o “Auto do Nascimento do Menino” (ambos de 1968) –, neste caso, o registo de
espetáculos de marionetas, mais concretamente, dos Bonecos de Santo Aleixo.
Quando se celebram os 75 anos do
Cineclube do Porto e se apresenta, pela primeira vez na cidade, o novo restauro
digital de O AUTO DA FLORIPES (a exibir na Casa das Artes, dia 24 de outubro,
às 18h00), a Casa do Cinema Manoel de Oliveira organiza uma sessão de ACTO DA
PRIMAVERA (no âmbito do seu programa Domingos na Casa da Cinema, no dia 25 de
outubro, às 17h00) propondo, assim, um diálogo entre os dois filmes.