NALINI MALANI
UTOPIA!?
ROTEIRO DA EXPOSIÇÃO
NALINI MALANI: A ARTE DA CITAÇÃO ENQUANTO ATIVISMO por Ana Cristina Mendes
Esta
será a primeira exposição em Portugal da celebrada artista indiana Nalini
Malani (Carachi, Índia indivisa, 1946). Amplamente conhecida pelas suas
pinturas e desenhos, a mostra em Serralves mostra uma faceta do seu trabalho
igualmente relevante mas com que os públicos estão porventura menos
familiarizados, apresentando exclusivamente as suas animações desenvolvidas entre
finais dos anos 1960 e a atualidade.
Foi
no final da década de 1960, numa cena artística indiana dominada por homens,
que Nalini Malani emergiu como uma voz provocatória e feminista, igualmente
pioneira no trabalho com meios artísticos como o cinema experimental, o vídeo e
a instalação. Além de dar voz às mulheres, a artista sempre se destacou como
uma artista preocupada com questões sociais, conferindo protagonismo aos
marginalizados através de histórias visuais (animações, nomeadamente) que exploram
temas como o feminismo, a violência, as tensões raciais e os legados
pós-colonialistas.
As
animações reunidas na exposição em Serralves, realizadas entre 1969 e 2020,
foram agrupadas sob o signo da Utopia (este é aliás o título da mais antiga
obra apresentada), relacionando-se, por um lado, com o sentimento utópico que
se seguiu à independência da Índia e, por outro, com a desilusão em relação
àquilo que o país se tornaria, governado por regras ditadas pela ortodoxia
religiosa. De qualquer forma, os trabalhos de Malani transcendem os traumas
nacionais para tratarem injustiças sociais globais. É o caso da grande
instalação imersiva que encerra a exposição, composta por nove projeções vídeo
de animações e frases. Can You Hear Me?,
embora tenha partido de uma violenta história passada na Índia, a morte
violenta de uma criança, é uma ode a todos aqueles que não têm voz. Realizada
entre 2017 e 2020, a instalação é composta por animações em que se sobrepõem
imagens realizadas pela artista e fragmentos de citações de escritores tão
influentes como Hannah Arendt,
James Baldwin, Bertolt Brecht, Veena Das, Faiz Ahmad Faiz, Milan Kundera,
George Orwell e Wislawa Szymborska. Segundo a artista, Can You Hear Me? corresponde ao tipo de animação a que se tem
dedicado mais recentemente, a que chama cadernos de notas [notebooks] e que são
realizados digitalmente num iPad. Malani já afirmou: “Quando eu vejo ou leio
alguma coisa que captura a minha imaginação, tenho a necessidade de reagir através
de um desenho ou de desenhos em movimento. Não exatamente na sua forma mimética
mas mais como uma ‘Memória Emoção’. Sinto-me como uma mulher com pensamentos e
fantasias que são disparados da sua cabeça. Cada um deles pode conter ideias
diferentes e não parecerem ser da mesma pessoa. Cada uma dessas vozes na minha
cabeça precisa portanto de uma diferente caligrafia[RN1] .”
A
exposição em Serralves acontece na esteira da atribuição à artista de uma das
mais prestigiantes distinções no mundo da arte contemporânea: o Prémio Joan
Miró 2019. Na sua sétima edição, o prémio organizado pela Fundació Joan Miró e
a Fundação “la Caixa” possibilitou a Nalini Malani a apresentação em 2020 de uma
exposição monográfica na Fundació Joan Miró, no âmbito da qual aconteceu uma conversa
entre a artista e William Kentridge, o artista sul-africano celebrizado pelas
suas instalações que, à imagem das animações que Malani apresenta em Serralves,
utilizam vídeos com desenhos em movimento para confrontarem os espectadores com
a vida dos silenciados, injustiçados e carenciados. Porque esta conversa ajuda
a esclarecer as motivações da artista por detrás das obras que compõem UTOPIA!?, disponibilizamos o link da
Fundació Juan Miró e ainda uma conversa entre a artista e Emily Butler,
curadora da Whitechapel Gallery (Londres), que apresenta neste momento (entre
23 de setembro de 2020 e 6 de junho de 2021) a instalação Can You Hear Me? como parte do seu prestigiado
programa anual de encomendas artísticas.
Mecenas da exposição