Biografia de Manoel de Oliveira
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Manoel Cândido Pinto de Oliveira nasceu a 11 de dezembro de 1908, no Porto. Foi o realizador com a mais longa carreira da história do cinema, num total de 84 anos entre a sua estreia na realização (Douro, Faina Fluvial, em 1931) e o seu último filme (Um Século de Energia, em 2015). Com uma filmografia que inclui mais de cinquenta títulos, foi o único cineasta a passar do cinema mudo ao cinema sonoro, do preto e branco à cor e da película de nitrato ao suporte digital. Conhecido como "o Mestre”, Manoel de Oliveira foi reconhecido internacionalmente pelos mais importantes festivais de cinema do mundo como expoente da arte cinematográfica e também pela sua longevidade, recebendo o título de "mais velho realizador em atividade”, uma vez que continuou a filmar até aos 106 anos.
Manoel Cândido Pinto de Oliveira nasceu a 11 de
dezembro de 1908, no Porto. Foi o realizador com a
mais longa carreira da história do cinema, num total
de 84 anos entre a sua estreia na realização (Douro,
Faina Fluvial, em 1931) e o seu último filme (Um
Século de Energia, em 2015). Com uma filmografia
que inclui mais de cinquenta títulos, foi o único cineasta a passar do cinema mudo ao cinema sonoro,
do preto e branco à cor e da película de nitrato ao
suporte digital. Conhecido como “o Mestre”, Manoel
de Oliveira foi reconhecido internacionalmente pelos
mais importantes festivais de cinema do mundo
como expoente da arte cinematográfica e também
pela sua longevidade, recebendo o título de “mais
velho realizador em atividade”, uma vez que continuou a filmar até aos 106 anos.
Depois do seu percurso liceal, o jovem Manoel
de Oliveira ganha notoriedade através do seu
envolvimento com o desporto. Ora pelo atletismo,
sagrando-se vice-campeão nacional de salto à vara
durante três anos consecutivos pelo Sport Club do
Porto (e praticando outras atividades acrobáticas,
como o trapézio voador), ora pelo automobilismo,
ficando em 3.º lugar no circuito da Gávea, no Brasil,
competindo como amador e vencendo várias
corridas a nível nacional. Casa-se com Maria Isabel
Brandão Carvalhais a 4 de dezembro de 1940,
com quem permanecerá casado até à data da sua
morte, numa união que durou perto de 80 anos.
Tiveram quatro filhos.
A sua aproximação ao cinema dá-se primeiro como
ator. Aos 20 anos junta-se à escola de representação de Rino Lupo, cineasta italiano radicado em
Portugal, aparecendo como figurante no filme
Fátima Milagrosa (1928). Pouco depois, com o
auxílio do amigo António Mendes (guarda-livros e
entusiasta da fotografia), filma e revela o negativo
de 35 mm de Douro, Faina Fluvial na garagem de
sua casa, e monta o filme (à mão e “a olho”) na
sua mesa de bilhar. O filme mudo, inspirado pelas
sinfonias urbanas dos anos 1920, é apresentado
em 1931 no V Congresso Internacional da Crítica,
no Cinema Central em Lisboa, sendo pateado pelos
espectadores nacionais e louvado por algumas personalidades internacionais (como Émile Vuillermoz
e Luigi Pirandello), inaugurando assim o que viria a
tornar-se recorrente no que respeita à receção da
sua obra em Portugal e no estrangeiro. Avelino de
Almeida, José Régio e Adolfo Casais Monteiro foram
alguns dos poucos intelectuais portugueses que
defenderam o filme. Durante os anos 1930, Oliveira
prepara vários projetos, a maioria gorada (alguns
deles retomados várias décadas depois), realiza documentários (como Hulha Branca, 1932, e Famalicão,
1940) e filmes de encomenda (Portugal Já Faz
Automóveis, 1938), todos de metragem curta.
Participa ainda como ator em A Canção de Lisboa
(1933), filme marcante do modelo de comédias
populares das décadas seguintes, na personagem
de galã, e Douro, Faina Fluvial acaba por estrear
em 1934, juntamente com Gado Bravo de António
Lopes Ribeiro, que co-produziria a sua estreia na
longa-metragem: Aniki Bobó, em 1942. Adaptando
o conto de João Rodrigues de Freitas, Os meninos
milionários, o filme faz um terno retrato da infância
nos bairros mais pobres do Porto. Devido ao insucesso comercial do filme, a obrigações familiares
e a um fechamento da área do cinema durante os
primeiros anos do Estado Novo, Manoel de Oliveira
inicia um interregno de 14 anos em que não consegue filmar. Só em 1955 pôs fim a esta travessia do
deserto, através de uma formação na Alemanha,
nos estúdios da Agfa-Gevaert AG, para adquirir conhecimentos sobre o cinema a cores. Desse estudo
resulta O Pintor e a Cidade (1956), que escreve,
filma, monta e realiza — e que lhe dá o primeiro de
muitos galardões, a Harpa de Prata no Festival da
curta-metragem de Cork. Já no final da década,
realiza o documentário O Pão (1959) por encomenda da Federação dos Industriais de Moagem. Uma
obra que descreve o “ciclo do pão” como o “ciclo da
vida”. A fechar aquela que pode definir-se como a
primeira fase da sua obra, marcada pelos hiatos de
inatividade, pela diversidade de abordagens e pela
produção irregular, estão duas obras já subsidiadas:
a curta-metragem alegórica A Caça (1963) — cujo
final seria censurado — e Acto da Primavera (1962),
uma longa-metragem semidocumental que regista
uma representação do Auto da Paixão de Cristo
numa aldeia de Trás-os-Montes.
Nestes filmes, nomeadamente em O Pintor e a
Cidade e Acto da Primavera, Oliveira inicia uma
MANOEL
DE OLIVEIRA
experimentação formal sobre a duração dos planos
(fixos) e sobre a aproximação ao teatro e à predominância da palavra que caracterizarão o “sistema
Oliveira” e que fundarão uma corrente do cinema
nacional, a “Escola Portuguesa”. Nos seus filmes
seguintes, embora ainda haja grande mobilidade
de câmara nalguns dos primeiros títulos, esta vai
progressivamente fixando-se e distendendo-se sobre
o corpo e o rosto dos atores que abordam o texto
numa perspetiva artificial que recusa entoações
sentimentais ou psicologistas. A preponderância do
texto literário ou teatral é cada vez mais marcada e
as adaptações (quase) integrais sucedem-se. Esta foi,
e ainda é, uma abordagem vanguardista ao cinema
narrativo que só encontra paralelo, no foco e no rigor,
em cineastas como Jean-Marie Straub e Danièle
Huillet, Werner Schroeter, Raúl Ruiz e poucos mais.
No contexto do Novo Cinema Português dos anos
1960, Manoel de Oliveira é elevado a figura de proa
da nova geração e o seu exemplo insubmisso faz
com que, no âmbito do sistema de financiamento
do recém-inaugurado Centro Português do Cinema,
Manoel de Oliveira seja o primeiro a receber apoio,
filmando O Passado e o Presente em 1971, já com
mais de 60 anos de idade. Essa adaptação da peça
teatral de Vicente Sanches marcaria o primeiro
ponto na autointitulada (e muito celebrada) “tetralogia dos amores frustrados”, que incluiria nos anos
seguintes: Benilde ou a Virgem Mãe (1974, rodado
durante a Revolução de Abril — adaptação da peça
homónima de José Régio), Amor de Perdição (1978,
adaptação quase-integral de Camilo Castelo Branco
— coproduzido pela RTP e exibido em horário nobre;
o estilo teatral e exaustivo da adaptação causaria
choque e aceso debate público) e Francisca (1981,
adaptação de Fanny Owen, que inauguraria colaboração próxima com a escritora Agustina Bessa-Luís).
Logo após estes quatro títulos, Oliveira roda Visita
ou Memórias e Confissões (1982, com 73 anos):
filme póstumo, em que filmou a sua casa da Rua da
Vilarinha, no Porto.
No entanto, o realizador não poderia antecipar que
a partir da epopeia recitativa de quase sete horas
de duração que é Le Soulier de satin / O Sapato de
Cetim (1985, adaptação integral de Claudel), iniciaria uma produção muito regular e praticamente anual, que incluiria a vanguardista colagem teatral
(Mon Cas / O Meu Caso, 1986, adaptando Régio,
Samuel Beckett e a Bíblia) e um filme de sketches
(Inquietude, 1998), um musical cómico-negro (Os
Canibais, 1988, adaptado de Álvaro do Carvalhal)
e uma comédia de seduções (Party, 1996), uma
erótica adaptação agustiniana de Madame Bovary
de Flaubert (Vale Abraão, 1993) e uma perversa revisitação de Luis Buñuel (Belle Toujours, 2006), um
sarcástico passeio pelas ruas da Mouraria (A Caixa,
1994, adaptando Prista Monteiro) e uma queirosiana
visita a Lisboa (Singularidades de uma Rapariga
Loura, 2009), uma interrogação sobre a verdadeira
nacionalidade de Shakespeare (O Convento, 1995,
mais uma vez em diálogo com Agustina) e outra
sobre as origens de Cristóvão Colombo (Cristóvão
Colombo, O Enigma, 2007), uma excursão autobiográfica no último papel para cinema de Marcello
Mastroianni (Viagem ao Princípio do Mundo, 1997),
outra com Michel Piccoli (Je rentre à la maison / Vou
Para Casa, 2001) e, por fim, com o próprio e o seu
neto ator, Ricardo Trêpa (Porto da Minha Infância,
2001). E também reflexões sobre a história de
Portugal e da Europa, vistas a partir das suas figuras
e das suas derrotas (Non, ou a Vã Glória de Mandar,
1990; sobre o Padre António Vieira, Palavra e Utopia,
2000; sobre o Rei D. Sebastião — a partir de Régio —,
O Quinto Império — Ontem como Hoje, 2004; e um
tour pelo Mediterrâneo em Um Filme Falado, 2003).
Já no século XXI, a obra de Manoel de Oliveira
voltou a alternar entre o formato longo e curto,
discorrendo sempre com grande ironia sobre os
tempos presentes e até sobre a sua própria obra.
O Gebo e a Sombra (2012) apresenta-se como uma
sátira sobre a crise financeira, a curta-metragem
O Conquistador Conquistado (2012) reflete sobre
os modos do turismo contemporâneo e a curta-
-metragem Do Visível ao Invisível (2007) diverte-se
com as falhas de comunicação modernas. Esta fase
final da sua obra caracteriza-se também pela recuperação de projetos antigos deixados incompletos.
Destaque para O Estranho Caso de Angélica (2010),
baseado num argumento originalmente escrito em
1952, para a dupla de curtas-metragens Romance
de Vila do Conde e O Poeta Doido, O Vitral e a
Santa Morta (1965/2008), rodada com José Régio
nos anos 1960, mas só terminada (montagem e
gravação da voz off de Luís Miguel Cintra) mais
de quarenta anos depois. Também Um Século de
Energia (2015), que inclui imagens rodadas por
Oliveira para Hulha Branca e O Velho do Restelo
(2014), revisita igualmente vários dos títulos anteriores do cineasta através do encontro, num banco
de jardim, de Dom Quixote, Luís Vaz de Camões,
Teixeira de Pascoaes e Camilo Castelo Branco.
Ao longo da sua carreira Manoel de Oliveira rodeou-
-se de uma série de técnicos e atores com os quais
formou uma equipa de caras recorrentes. Vejam-se
os diretores de fotografia Mário Barroso e Renato
Berta, a montadora Valérie Loiseleux e a anotadora
Júlia Buísel, ou dos diversos produtores que o acompanharam ao longo da sua carreira, como Paulo
Branco, Miguel Cadilhe, François d’Artemare ou, mais
recentemente, Luís Urbano. E claro, atores portugueses como Luís Miguel Cintra, Leonor Silveira, Ricardo
Trêpa, Diogo Dória ou Leonor Baldaque, e atores estrangeiros como, Catherine Deneuve, John Malkovich,
Michel Piccoli, Marcello Mastroianni, Michael Lonsdale,
Jeanne Moreau, Bulle Ogier ou Claudia Cardinale.
Os seus filmes foram presença habitual nos mais
reconhecidos festivais de cinema do mundo, com
especial destaque para os festivais de Cannes e
Veneza.
Recebeu vários prémios ao longo da sua
extensa carreira, notoriamente, o Leão de Ouro
Especial em 1985 por Le Soulier de satin / O Sapato
de Cetim e o Prémio Especial do Júri, também em
Veneza, por A Divina Comédia, em 1991. Em Cannes,
recebeu uma Menção Especial na Quinzena dos
Realizadores, em 1993, com Vale Abraão; já em 1997,
o Prémio da Crítica Cinematográfica por Viagem ao
Princípio do Mundo, e em 1999, o Prémio do Júri para
La Lettre / A Carta.
Além de vários outros galardões
e homenagens, destacam-se os prémios de carreira
dos festivais: de Berlim (em 1981, Prémio Interfilm
Especial, e em 2009, Prémio Berlinale Kamera); de
Locarno (Leopardo de Honra, em 1992); e de Cannes
(Palma de Ouro Honorária, em 2008). E as condecorações da República Portuguesa (Comendador da
Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, em 1980, GrãCruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, em
1988, e a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique,
em 2008) e da República Francesa (Grande-Oficial da
Ordem Nacional da Legião de Honra, em 2014).
LISTA SELETIVA DE PRÉMIOS
PRÉMIOS A FILMES
O Pintor e a Cidade
Festival de Curta-metragem de Cork — Harpa de Prata;
Acto da Primavera
Festival de Siena (1964) — Prémio para a Melhor Realização
da Casa da Imprensa, Medalha de Ouro;
Amor de Perdição
Festival da Figueira da Foz (1979) — Prémio Especial do Júri
para o filme e para o conjunto da obra;
Francisca
Festival de Cinema de Sorrento, Itália — Medalha de Ouro,
Prémio Vittorio de Sica
Le Soulier de satin
Mostra Internazionale d’Arte Cinematografica (1985) —
Leão de Ouro especial pelo conjunto da obra;
Os Canibais
Festival Internacional de Cinema de São Paulo (1988) —
Prémio Especial de Critica;
A Divina Comédia
Festival de Cinema de Veneza (1991) — Prémio Especial do
Júri;
Vale Abraão
Festival de Cannes (1993) — Quinzena dos Realizadores
(Menção Especial);
Festival Internacional de Cinema de São Paulo (1993) —
Prémio da Crítica;
Festival Internacional de Cinema de Tóquio (1993) —
Prémio para a melhor contribuição artística;
O Convento
Festival Internacional de Cinema da Catalunha (1995) —
Prémio Especial da Critica Literária;
Viagem ao Princípio do Mundo
Festival de Cannes (1997) — Prémio FIPRESCI;
Festival Internacional de Cinema de Tóquio (1997) —
Prémio Especial de Carreira;
Prémios Europeus de Cinema (1997) — Prémio FIPRESCI;
Festival Internacional de Cinema de Haifa (1997) — Âncora
de Ouro;
La Lettre
Festival de Cannes (1999) — Prémio do Júri;
Inquietude
Festival de Cinema de Mar del Plata (1998) — Prémio Especial
do Júri;
Globos de Ouro (1999) — Globo de Ouro para o Melhor
Realizador;
O Porto da Minha Infância
Festival de Cinema de Veneza (2001) — Prémio UNESCO
Je rentre à la maison
Festival Internacional de Cinema de Haifa (2002) — Âncora
de Ouro;
Festival Internacional de Cinema de São Paulo (2001) —
Prémio da Crítica;
Um Filme Falado
Festival de Cinema de Veneza (2003) — Prémio SIGNIS;
O Gebo e a Sombra
Festival de Cinema de Abu Dhabi (2012) — Prémio Especial
do Júri;
PRÉMIOS DE CARREIRA
Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz (1980) —
Prémio CIDAIC, Medalha de Ouro
Festival Internacional de Cinema de Berlim (1981) — Prémio
Interfilm Especial
Festival de Cinema de Cannes (1990) — Prémio FIPRESCI
Especial
Festival Internacional de Cinema de Locarno (1992) —
Leopardo de Honra
Festival Internacional de Cinema de São Francisco (1994) —
Prémio Akira Kurosawa
Prémios David di Donatello (1994) — Prémio Luchino Visconti
Prémios Internacionais Flaiano (1998) — Prémio Carreira
Festival de Cinema de Munique (2001) — Prémio CineMerit
Festival Internacional de Cinema de São Paulo (2004) —
Prémio Humanitário
Camerimage (2004) — Lifetime Achievement Award
for Directing
Festival Internacional de Cinema de Chicago (2005) — Lifetime
Achievement Award
Fantasporto (2006) — Prémio Especial de Carreira
Festival Internacional de Cinema Documental de Jihlava
(2006) — Contribution to World Cinema
Prémios Europeus de Cinema (2007) — Prémio Honorário
Festival de Cinema de Cannes (2008) — Palma de
Ouro Honorária
Festival Internacional de Cinema de Berlim (2009) —
Berlinale Kamera
Globos de Ouro (2009) — Prémio Carreira
Prémios Sophia (2013) — Prémio Mérito e Excelência
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